No outono de 1970, o mundo do rock and roll testemunhava o reinado de uma figura inesquecível: Janis Joplin. Ela não era apenas uma estrela, mas a rainha indiscutível do rock and roll, um fato que precedia qualquer outra mulher no cenário musical. Sua filosofia era clara: se é bom, faça. Conhecida como a “wildchild” do rock, Janis Joplin escondia um lado sombrio e autodestrutivo.
Era uma garota profundamente perturbada, mas também uma genial artista. Conseguia ser tão terna quanto dura, e ambas as qualidades eram autênticas. Acreditava-se que ela buscava algum tipo de alívio, um escape da própria identidade que a consumia. Infelizmente, um tiro de heroína quase pura colocaria um fim precoce à sua brilhante e meteórica carreira.
Janis Joplin: A Chama Que Queimou Demais
Os últimos dias de Janis Joplin foram marcados por uma mistura de esperança e desespero. Em 3 de outubro de 1970, em Hollywood, Califórnia, a superestrela do rock and roll estava na cidade há um mês, trabalhando em seu mais recente álbum, simplesmente intitulado “Pearl”. Ela estava hospedada no Landmark Hotel, onde, em menos de 24 horas, morreria sozinha.
Era 1h30 da tarde e Janis ainda estava em seu quarto. Com a banda ocupada no estúdio de gravação e sem a necessidade de sua presença até mais tarde, ela se viu com tempo livre. Uma ligação para a prefeitura de São Francisco, na esperança de obter informações sobre uma licença de casamento, revelou seus planos de se casar com Seth Morgan, um homem que conhecia há apenas alguns meses.
Alguns de seus amigos estavam céticos quanto ao relacionamento, mas seu empresário de estrada, John Cook, via o romance de forma positiva. Janis acreditava ter encontrado o verdadeiro amor, descrevendo-o como diferente de suas relações anteriores: “Eles não precisavam sair para curtir todas as noites; podiam ler o jornal juntos pela manhã e conversar sobre assuntos atuais.”
No entanto, a ligação de Janis para a prefeitura esbarrou em um problema: era sábado e os escritórios municipais estavam fechados. Ela teria que tentar novamente na segunda-feira. Com uma tarde inteira pela frente e pouco para fazer, Janis Joplin começou a ficar inquieta. Não gostava de ficar sozinha e precisava de algo para preencher o vazio.
Os dias de gravação, embora importantes, careciam da energia do palco. Não havia público, e Janis não suportava o tédio. Ela pegou o telefone novamente e ligou para seu “Candyman”, um traficante que concordou em levar um “pacote especial” ao hotel. Um pacote que, sem que ela soubesse, selaria seu destino.
De Port Arthur ao Estrelato: A Rebeldia Que Virou Arte
A vida de Janis Joplin começou em Port Arthur, Texas, em 19 de janeiro de 1943. Uma cidade respeitável e conservadora, um berço improvável para a mulher que se tornaria a “wild woman of blues”. Sua infância foi normal e feliz, mas tudo mudou na adolescência. Sua mãe desejava que Janis fosse popular e se encaixasse, mas Janis não seguiu esse caminho.
Afetada por acne severa e um corpo subdesenvolvido, a adolescente foi rejeitada pelos colegas. Para Janis que antes era popular, foi devastador. Ela lidou com a rejeição rebelando-se, vestindo-se de preto, xingando como um marinheiro e desafiando os valores hipócritas de sua pequena cidade. Quanto mais ela se rebelava, mais era isolada.
No entanto, Janis encontrou refúgio em um pequeno grupo de outros jovens “outsiders”. Com eles, fazia viagens ilícitas à Louisiana, onde buscavam aventura e encontraram a fruta proibida: a música negra. Passavam as madrugadas em clubes, absorvendo o blues e o jazz, e bebendo. Foi nesse ambiente mágico que Janis se conectou profundamente com o blues, uma paixão que moldaria sua vida.
Em 1962, aos 19 anos, Janis deixou a família e a cidade natal. Em Austin, no Texas, e depois em São Francisco, ela encontrou uma comunidade de artistas e músicos com a mesma mentalidade. Lá, ela se estabeleceu na cena musical local, encontrando shows em cafés e bares. Mas, junto com a música, uma oferta abundante de drogas também a esperava.
Em 1967, no Monterey International Pop Festival, Janis Joplin, à frente do Big Brother and the Holding Company, explodiu. As pessoas simplesmente não tinham ouvido uma garota branca cantar blues daquela maneira. Sua apresentação foi tão impactante que se tornou uma sensação da noite para o dia. A imprensa enlouqueceu por ela.
Janis era real, incrivelmente real e aberta. Ela não era as cantoras doces da época. Era uma roqueira que se movia no palco como ninguém, desinibida e franca. Sua autenticidade e espírito livre tocaram profundamente a audiência, especialmente as mulheres, que se identificavam com sua defesa do direito de ser orgulhoso de si mesmo. Para muitos, ela se tornou uma voz para sua geração, um papel que ela abraçou com entusiasmo. Sua maneira de fazer arte ressoava com a ideia de uma música de verdade, onde a essência humana vence o algoritmo.
Por trás da bravata, contudo, Janis era solitária e insegura, sobre sua aparência, seu talento e sua popularidade. Álcool e drogas preenchiam o vazio, e com a crescente fama, veio uma crescente dependência, uma sombra escura que a seguiria até um quarto de hotel solitário em Hollywood.
O Último Ato: Uma Busca por Amor e um Fim Prematuro
No final de 1968, impulsionada pelo que a imprensa dizia e ansiosa por mais fama, Janis anunciou sua saída do Big Brother. Foi uma decisão que a assombraria, pois ela havia abandonado sua “família” musical, aqueles que a amavam e aceitavam como ela era. Esse caminho autodestrutivo a levaria, em menos de três horas, a um beco sem saída.
Naquela noite de 3 de outubro de 1970, no estúdio, Janis Joplin estava empolgada com o ambiente positivo e decidiu compartilhar seu bom humor com Seth Morgan. Ligou para sua casa em São Francisco, mas ele não estava lá; a colega de quarto informou que Seth havia saído para a noite. Sentindo-se abandonada, Janis buscou conforto na garrafa, uma das poucas constantes em sua vida.
Medicamentos em tempos de crise eram algo que Janis fazia a maior parte de sua vida. Em 1969, após deixar o Big Brother, seus maus hábitos se transformaram em vícios que ameaçavam sua vida. Ela formou a Cosmic Blues Band, mas o projeto foi um desastre. Os críticos a massacraram, e ela ficou arrasada, voltando a se automedicar com heroína e álcool. Assim como Amy Winehouse, cujo legado é eterno, Janis também enfrentou a batalha contra seus demônios internos.
Apesar de tentativas de se limpar, a adição de Janis continuava a espiral, levando a overdoses e um desgaste visível. Na manhã de 4 de outubro de 1970, após uma última noite com a Full Tilt Boogie band, seu novo grupo, Janis Joplin retornou ao Landmark Hotel. Despediu-se da banda e voltou ao seu quarto sozinha. Pegou a heroína que comprara mais cedo e preparou-se para injetá-la.
Depois de sua última dose, Janis saiu do quarto para ir à recepção buscar troco para a máquina de cigarros. O gerente noturno foi a última pessoa a vê-la viva. Ela comprou um maço de Marlboro, retornou ao quarto 105 e começou a se despir. De repente, ela caiu para frente, enquanto uma dose de heroína quase pura atingia seu cérebro, derrubando-a no chão.
Era 1h30 da manhã de 4 de outubro de 1970. Janis Joplin havia injetado uma dose de heroína “adulterada”, que parou seu coração. Pelas 18 horas seguintes, ela permaneceu sem ser descoberta, presa entre sua cama e uma mesa de cabeceira. No dia seguinte, quando não apareceu no estúdio, seu produtor, Paul Rothchild, ligou para seu empresário, John Cook, que a encontrou sem vida. A autópsia confirmou a morte por overdose massiva, com a heroína em seu sistema sendo de 40% a 50% pura, um nível letal para qualquer um, especialmente para alguém que havia parado de usar.
O álbum “Pearl” foi lançado quatro meses depois e se tornou seu disco mais vendido e aclamado pela crítica. O legado de Janis Joplin perdura, sua voz inconfundível ainda ressoa nas rádios, lembrando o mundo da “race car driver” do rock que, apesar de todo o brilho, acabou saindo da pista cedo demais.
Tags:
Janis Joplin, Rainha do Rock, Blues, Rock and Roll, Pearl, Landmark Hotel, Seth Morgan, Big Brother and the Holding Company, Monterey Pop Festival, Cosmic Blues Band, Full Tilt Boogie Band, Overdose, Vício, Música, Lenda do Rock