George Harrison e o Rock Pesado: Uma Visão Sutil da Guitarra Elétrica
George Harrison e o Rock Pesado: Uma Visão Sutil da Guitarra Elétrica

George Harrison e o Rock Pesado: Uma Visão Sutil da Guitarra Elétrica

O universo musical passou por uma transformação radical no final dos anos 1960. A guitarra elétrica, antes um mero acompanhamento, emergiu como uma força expressiva dominante no rock. Essa mudança não se deu apenas pelos talentos de guitarristas como Jeff Beck, Jimmy Page e Jimi Hendrix, mas também pelos avanços significativos na amplificação e nos efeitos sonoros.

Antes dessa efervescência, o rock and roll era dominado por músicos como Keith Richards e o próprio George Harrison. Ambos tinham um pé fincado nos estilos que precederam o boom do rock britânico e outro numa forma de tocar mais expressiva e inspirada no blues. Harrison, em particular, desenvolveu uma paixão pelo estilo de solo de guitarra mais lento e de nota única, que se destacou na forma de tocar de Robbie Robertson, da The Band, e de seu amigo Eric Clapton.

George Harrison e a Distorção Excessiva

Contudo, Harrison não se alinhou ao rock mais pesado que surgiu em seguida. Para ele, Clapton havia levado a guitarra elétrica a um novo patamar de força com seu trio Cream, mas o que veio depois disso já era “simplesmente demais”. Sua preferência musical era clara e nostálgica.

“No que diz respeito a ouvir, eu preferiria escutar alguém como Little Richard ou Larry Williams”, relembrou ele em uma ocasião, conforme citação da Rolling Stone. “Eu nunca gostei de tudo aquilo do final dos anos 60, depois que o Cream se desfez — todas aquelas guitarras Les Paul gritando e distorcendo.” Essa declaração revela muito sobre o gosto musical e a sensibilidade de Harrison, que prezava a melodia e a clareza.

9 - George Harrison

Clapton esteve no epicentro da explosão do blues britânico após sua saída dos Yardbirds em 1965, quando se juntou aos Bluesbreakers de John Mayall. Mas ao formar seu próprio e vibrante trio, Cream, inspirado por uma apresentação de Buddy Guy em Londres, ele impulsionou o blues para territórios novos e mais agressivos. A sonoridade do Cream, com sua mistura potente de blues-rock e elementos de jazz, foi crucial para abrir caminho para as cenas de hard rock e heavy metal que surgiram mais tarde.

George Harrison e o Rock Pesado: Uma Visão Sutil da Guitarra Elétrica

Até mesmo Clapton reconheceu esse impacto anos depois. “Acho que fomos uma das primeiras bandas de heavy metal sem saber”, disse ele. “Depois que nos separamos, o Led Zeppelin preencheu o vazio.” É fascinante observar como a percepção de um gênero pode evoluir e ser reinterpretada pelos próprios criadores.

A Sutileza de Clapton: Um Admirador Inesperado

Embora o hard rock tenha nos presenteado com muitos músicos virtuosos, Harrison sempre preferiu o lado mais expressivo e menos estridente do trabalho de guitarra. Ele valorizava a sutileza acima da ostentação.

“Eu gosto de sutileza, como Ry Cooder e Eric Clapton”, afirmou Harrison. “Eric é fantástico. Ele poderia ofuscar todos aqueles outros músicos no palco se quisesse, mas ele é mais sutil que isso.” Essa visão ressalta a importância da musicalidade e da emoção sobre a mera técnica, um contraste direto com a abordagem de alguns de seus contemporâneos.

Sua famosa frase sintetiza essa filosofia: “E, pessoalmente, prefiro ouvir três notas tocadas de forma realmente doce do que ouvir um monte de notas de algum guitarrista cujos ouvidos estão tão gastos que ele não consegue distinguir a diferença entre um bemol e um sustenido.” É uma crítica mordaz, mas que expressa a profundidade de seu apreço pela precisão e sentimento na música.

O grande elogio de Harrison a Clapton veio poucos anos depois de os dois terem supostamente travado um “duelo de guitarras” por seu amor mútuo por Pattie Boyd, então esposa de Harrison. Clapton se apaixonou por ela em 1970, o que levou à sua angustiada carta de amor em forma de canção, “Layla“, do álbum de Derek and the Dominos, Layla & Other Assorted Love Songs. Embora a autoria da melodia esteja hoje sob alegações de plágio, a intensidade da composição é inegável.

Curiosamente, na entrevista à Rolling Stone, Harrison não mencionou o guitarrista que ele considerava responsável pelo “maior solo de guitarra de todos os tempos”. Um silêncio que, por si só, é bastante eloquente.

Em suma, a perspectiva de George Harrison sobre a evolução da guitarra elétrica nos anos 60 e 70 oferece uma janela única para a mentalidade de um dos maiores músicos de sua geração. Sua preferência pela sutileza, melodia e sentimento, em contraste com o rock mais pesado e distorcido, destaca a diversidade de abordagens musicais que coexistiam e moldaram o cenário do rock. Sua admiração por Eric Clapton, apesar das complexidades pessoais, reforça a ideia de que a arte transcende as rivalidades, focando sempre na essência da expressão musical. A guitarra, para Harrison, era uma ferramenta de poesia, não apenas de potência.

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