A história do rock é repleta de lendas, não apenas musicais, mas também de dramas pessoais que se entrelaçam com a criação artística. Entre amizades profundas, rivalidades intensas e paixões avassaladoras, poucos enredos se destacam tanto quanto o triângulo amoroso envolvendo dois dos maiores guitarristas de todos os tempos: George Harrison e Eric Clapton, disputando o coração de Pattie Boyd.
A relação entre George Harrison e Eric Clapton nasceu da admiração mútua e da paixão pela música. Sua amizade floresceu no auge da Beatlemania, em 1964, quando os Yardbirds de Clapton abriram para os Beatles em Londres. Essa camaradagem musical levaria a colaborações icônicas, como o solo inconfundível de Clapton em ‘While My Guitar Gently Weeps’ e a coautoria de Harrison na canção ‘Badge’, do Cream.
Entretanto, por trás dos acordes harmoniosos, uma melodia dissonante começava a ser composta. Em 1970, com os Beatles à beira do colapso, Clapton foi atingido pela flecha do cupido, mas não por uma mulher qualquer. Ele se apaixonou perdidamente por Pattie Boyd, a esposa de George Harrison há quatro anos, e musa inspiradora da imortal ‘Something’, dos Beatles.
O Estopim da Paixão Proibida
Ardendo em uma paixão não correspondida, Clapton arquitetou um encontro secreto com Pattie em um apartamento em South Kensington. Seu objetivo era revelar o turbilhão de sentimentos que o consumia, expresso através de sua arte. “Ele ligou o toca-fitas, aumentou o volume e tocou a música mais poderosa e emocionante que eu já tinha ouvido”, Pattie Boyd recordou em sua autobiografia de 2007, Wonderful Today. A canção era ‘Layla’, um grito apaixonado que ecoava seu amor proibido.
A semente da paixão estava plantada. Naquela mesma noite, durante uma reunião na casa do empresário Robert Stigwood, George Harrison procurou Pattie e a encontrou em uma conversa profunda com o ex-guitarrista do Cream. A tensão era palpável. “George se aproximou e exigiu: ‘O que está acontecendo?’”, lembrou Boyd. Para seu horror, Eric disse: ‘Tenho que te dizer, cara, que estou apaixonado pela sua esposa’. Eu queria morrer. George ficou furioso. Ele se virou para mim e disse: ‘Bem, você vai com ele ou vem comigo?’”. Pattie, naquele instante, decidiu ir para casa com George.
Vidas Fraturadas e Desafios Pessoais
Os anos seguintes foram turbulentos para o casamento de Pattie e George. A crescente devoção de Harrison à espiritualidade indiana começou a afastá-lo de Boyd, e as dificuldades em formar uma família, juntamente com casos extraconjugais de ambos os lados – incluindo supostos romances de Pattie com Ronnie Wood, dos Rolling Stones, e Maureen Starkey, esposa de Ringo Starr – cobraram seu preço. Para Clapton, os sentimentos não correspondidos resultaram em um período de depressão profunda, isolando-se em sua mansão e mergulhando no vício em heroína.
A Batalha de Guitarras: Um Duelo por Amor
Em 1974, em meio ao caos emocional que cercava os três, Eric Clapton, embriagado e perdido em sua obsessão, apareceu na propriedade de Friar Park, residência de George e Pattie. A atmosfera era carregada. A resposta de Harrison foi inesperada e digna de um conto de cavalaria: um desafio musical. “George lhe entregou uma guitarra e um amplificador – como um cavalheiro do século XVIII entregaria uma espada a seu rival – e por duas horas, sem uma palavra, eles duelaram”, Pattie Boyd relembrou.
O duelo de guitarras foi uma batalha de almas, onde cada nota era um sentimento, cada solo uma declaração. “No final, nada foi dito, mas a sensação geral era que Eric havia vencido. Ele não se permitiu ficar irritado ou se entregar a acrobacias instrumentais como George. Mesmo quando estava bêbado, sua forma de tocar guitarra era imbatível”, afirmou Boyd. O ator John Hurt, também presente, descreveu o confronto como “extraordinário… O ar estava elétrico. Ninguém ousava dizer uma palavra”.
O Legado de um Triângulo Famoso
Apesar da vitória percebida de Clapton no duelo, a história daquele triângulo amoroso ainda teria muitos capítulos. Pattie Boyd e Eric Clapton eventualmente se casariam em 1979. No entanto, o casamento deles duraria apenas oito anos, marcado pelo alcoolismo, infidelidades e, como Clapton admitiria mais tarde, instâncias de abuso. Pattie, exausta, finalmente o deixou.
Ao longo dos anos, Clapton revelou um carinho fraterno por George Harrison, o que levou Pattie a refletir sobre a natureza da paixão de Eric por ela. Em seu livro de 2006, Layla e Outras Canções de Amor, Boyd sugeriu que o desejo de Clapton por ela poderia ter nascido de uma competição quase fraternal: “Eric só queria o que George tinha”. Uma observação perspicaz que resume a complexidade de uma das mais fascinantes e dolorosas histórias de amor e amizade na história do rock.
Ainda que o duelo de guitarras tenha tido um vencedor musical, o verdadeiro triunfo, talvez, tenha sido a capacidade de todos eles de, apesar da dor e da traição, de alguma forma, seguir em frente e continuar a criar a música que tocou e ainda toca milhões de corações ao redor do mundo.
