No mundo do rock, poucas figuras brilham com a intensidade e a autenticidade de Bon Scott. O lendário vocalista do AC/DC não foi apenas um frontman; ele era a personificação da rebeldia, do carisma e da energia crua que transformou uma banda de bar australiana em uma potência global do rock. Sua vida, embora breve, deixou uma marca indelével na música, uma história de paixão, excessos e um talento inegável.
Ronald Belford Scott, ou simplesmente Bon, nasceu em Forfar, Escócia. Cresceu em Kirriemuir, uma pequena cidade que ainda hoje homenageia sua memória. Aos seis anos, sua família imigrou para Fremantle, Austrália Ocidental, como parte de um esquema de passagem assistida pós-guerra, que, sem saber, traria ao país uma nova geração de roqueiros britânicos. Bon cresceu rápido, resiliente e incansavelmente inquieto, já obcecado por música.
As Origens de um Ícone: A Formação de Bon Scott
Desde cedo, Bon Scott percebeu que o mundo tradicional não era para ele. A escola não prendia sua atenção, mas a bateria sim. Suas primeiras bandas, The Spectors e The Valentines, revelaram seu talento para o ritmo e sua inclinação para a travessura. Os Valentines, por um breve período, foram ídolos pop, conquistando hits de rádio e capas de revistas adolescentes. No entanto, o apetite de Bon pelo caos nunca estava longe.
Após vários problemas com a lei, ele foi enviado a uma instituição juvenil por um tempo. Essa foi uma lição dura, mas que lhe deu perspectiva. Lá, ele encontrou outros jovens tocando guitarra e formando uma banda. Ao sair, Bon tinha uma nova direção. No início dos anos 70, ele liderava o Fraternity, um grupo mais sério e com sonoridade blues, que chegou a fazer turnês com o Deep Purple e se mudou brevemente para a Inglaterra. Foi no Fraternity que Bon Scott aprendeu a cantar e a se portar como um verdadeiro frontman. Contudo, o sucesso comercial os iludiu.
Quando a banda se desfez, Bon se viu à deriva, trabalhando em empregos temporários. Um acidente de motocicleta, após uma discussão acalorada em um ensaio de banda, o deixou em coma por vários dias. Quase o matou, mas também o recolocou no rumo. Meses depois, o destino lhe daria uma segunda chance.
A Chegada de Bon Scott ao AC/DC: O Pedaço que Faltava
Em 1974, o AC/DC já ensaiava sob o olhar atento dos irmãos Young. Procuravam um novo cantor: alguém com atitude, coragem e resistência. Bon apareceu em um ensaio, observou a banda tocando e ofereceu-se para pegar o microfone. Ao final da noite, eles sabiam que ele era a peça que faltava. Anteriormente, Bon havia trabalhado como motorista para a banda, transportando-os de hotéis para shows. Ele se apresentou aos Youngs dizendo: “Eu sei cantar”. A audição deu certo, e ele passou de chofer a vocalista.
Bon Scott trouxe perigo, humor e uma atitude de classe trabalhadora que se encaixava perfeitamente com os Youngs. Com ele no palco, o AC/DC deixou de soar como uma banda de pub para se tornar um movimento. Seus primeiros álbuns, “High Voltage” e “T.N.T.”, anunciavam um novo tipo de rock: cru, urbano e gloriosamente barulhento. A banda era feita para a estrada. Na Austrália, tocavam em qualquer lugar que os aceitasse e, muitas vezes, em lugares que não deveriam.
O carisma de Bon transformava o caos em diversão. Ele era atrevido, mas nunca falso, um frontman que podia rir, zombar e rosnar em um mesmo verso. Em 1976, quando o AC/DC se mudou para a Grã-Bretanha, estavam sem dinheiro, mas determinados. Não tinham equipe de estrada, grande contrato de gravação ou sequer um quarto de hotel decente, mas tinham músicas e um cantor que sentia cada palavra que cantava. Álbuns como “Dirty Deeds Done Dirt Cheap” e “Let There Be Rock” deram voz aos frustrados e aos destemidos. Bon não interpretava um personagem; ele era a coisa real.
O Legado Imortal de Bon Scott: Além da Estrada para o Inferno
Bon tinha um brilho nos olhos, um sorriso atrevido que prometia diversão. Possuía o charme de um pirata e a atitude de um caminhoneiro. Mas por trás do sorriso, havia um compositor, alguém capaz de transformar a loucura da vida na estrada em versos que pareciam sujos e verdadeiros ao mesmo tempo. Canções como “Whole Lotta Rosie” e “Highway to Hell” não foram inventadas; elas foram vividas. Seus colegas de banda e amigos viam ambos os lados dele: fora do palco, podia ser atencioso e gentil; no palco, era imparável.
Mas as turnês intermináveis, as noites tardias e o consumo excessivo de álcool estavam cobrando seu preço. Em 1979, o AC/DC finalmente estava estourando na América. “Highway to Hell” foi o álbum que os levou ao estrelato, e foi o último que Bon Scott terminaria. O título não era uma profecia, mas capturava algo real: Bon estava exausto. A ascensão da banda havia sido implacável, e a fama trouxe uma solidão peculiar. Amigos lembravam-se dele falando em desacelerar, escrever mais, talvez até tirar uma folga, mas ele nunca teve a chance.
Em 19 de fevereiro de 1980, Bon Scott foi encontrado morto em Londres, após uma noite de bebedeira com amigos. O relatório do legista listou a causa como morte por desventura devido a envenenamento agudo por álcool. Ele tinha apenas 33 anos. O choque foi imediato. A banda ficou devastada, incerta se deveria continuar. Mas os pais de Bon os incentivaram a seguir em frente, dizendo que era o que ele teria desejado.
Meses depois, encontraram um novo cantor, Brian Johnson, e começaram a gravar “Back in Black”, um álbum dedicado inteiramente à memória de Bon. Tornou-se um dos discos mais vendidos da história. Johnson, que muitas vezes sentiu a presença de Bon no estúdio, ajudou a levar o legado adiante. A lenda de Bon Scott não é apenas sobre as noites selvagens ou o sorriso perigoso; é sobre a honestidade. Ele cantou o que viveu e viveu sem compromisso. Para aqueles que o conheceram, não era um clichê do rock; era um amigo, um brincalhão, um poeta com terra nas unhas. Toda vez que alguém toca um antigo disco do AC/DC, a voz de Bon ainda ressoa como um raio de verdade: crua, humana e inconfundivelmente viva. Bon Scott, partiu cedo demais, mas jamais será esquecido.







